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Crise do coronavírus afeta exportações e importações brasileiras de hortaliças

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O Brasil produz anualmente cerca de 20 milhões de toneladas de hortaliças, sendo que quase a totalidade desse volume é destinada ao consumo doméstico. Assim, diferentemente das commodities (soja, milho, café, açúcar, carne, etc.) que exportamos, o mercado externo de hortaliças no Brasil restringe-se a poucos países e a algumas espécies, em especial ao melão e à melancia, convencionalmente chamadas de frutas, mas categorizadas como hortaliças devido ao seu ciclo curto e por serem plantas herbáceas. Produtos, como abóbora, batata-doce, gengibre, inhame e derivados de pimentas, dentre outros, também são exportados, mas em menores quantidades e valores. Com relação à importação, algumas hortaliças, como alho, batata, cebola e as hortaliças leguminosas denominadas pulses (ervilha, lentilha e grão-de-bico) têm sido as mais importantes.

A pandemia causada pelo novo coronavírus tem gerado uma enorme crise em diferentes aspectos das cadeias produtivas, incluindo a comercialização dos produtos agrícolas. Não se sabe até quando essa crise irá perdurar e, assim, não podemos, com precisão, prever ou determinar o tamanho das consequências. É verdade que, em um curto período, algumas implicações no transporte e na comercialização de produtos já têm sido notadas, com prejuízos a produtores, indústrias e comércios de produtos olerícolas. Neste artigo, discutiremos o panorama de exportações e importações brasileiras das principais hortaliças comercializadas pelo país.

O Brasil exportou, em 2019, cerca de 251,6 mil toneladas de melão fresco (tipos amarelo e nobres) no valor de US$ 160,3 milhões, e 102,9 mil toneladas de melancia fresca (tipo baby, sem sementes) no valor de US$ 43,8 milhões, principalmente para Holanda, Espanha e Reino Unido. Por estarmos no período de entressafra, a exportação de melão e melancia, neste momento, é praticamente nula. Contudo, no período de maio a agosto, a produção interna da Europa, principalmente na Espanha, deverá ser reduzida pela falta de mão de obra, principalmente dos imigrantes africanos, devido à crise do coronavírus. Isso poderá ser, até certo ponto, vantajoso para o Brasil, pois deve haver aumento de exportação para os países europeus no segundo semestre de 2020. O plantio, em meados do ano, nos estados do Ceará e do Rio Grande do Norte – principais polos produtores no Brasil – para atender à exportação a partir de agosto ainda está incerto, uma vez que os compradores europeus estão aguardando o início do processo de negociação, o que deve ocorrer no próximo mês de maio. Por outro lado, em relação ao consumo interno, hortaliças como melão e melancia apresentam maior durabilidade (shelf-life) após a colheita, tanto no mercado quanto em casa, quando comparadas a outras frutas; e neste momento em que as pessoas estão indo menos às compras, sem dúvida, torna-se um importante atributo e vantagem para essas hortaliças.

Embora sem uma análise aprofundada do mercado externo em relação ao novo coronavírus, é importante mencionar que o Brasil tem exportado outras hortaliças, mas em menores volumes e valores quando comparados, por exemplo, com melão e melancia. Assim, em 2019, o Brasil exportou 22 mil toneladas de gengibre a um valor de US$ 22,1 milhões, principalmente para Europa, Argentina, EUA e Rússia. O inhame é outro produto a ser considerado na pauta de exportação, sendo que, no último ano, o país exportou 5,6 mil toneladas em uma cifra de US$ 6,2 milhões, principalmente para os EUA e a Europa. Os produtos derivados de pimenta (seca ou em pó) foram exportados principalmente para a Alemanha e atingiram, no ano passado, o volume de 2,2 mil toneladas, o que representa um valor de US$ 4,5 milhões. Já a batata-doce, exportada principalmente para a Europa e a Argentina, atingiu, em 2019, um volume de 8,8 mil toneladas a uma cifra de US$ 4,4 milhões, enquanto a abóbora foi exportada também nesse mesmo ano para países da Europa e da Argentina em um volume de 7,4 mil toneladas e um valor de US$ 2,4 milhões. Assim, o valor de exportação do Brasil, em 2019, com estes cinco produtos – gengibre, pimenta, inhame, batata-doce e abóbora – atingiu US$ 39,6 milhões.

No que se refere às movimentações no contexto de importação de hortaliças, o Brasil produz aproximadamente 45% do alho que é consumido internamente. Esse importante produto da nossa culinária é importado principalmente da Argentina e da China, totalizando, apenas em 2019, cerca de 165,5 mil toneladas a um valor de US$ 225 milhões, o que equivale a 55% da necessidade anual. O alho que estamos consumindo no Brasil, neste momento, é de estoque nacional (alho armazenado) ou vindo da Argentina, país que deve manter as exportações de alho ainda pelos próximos dois meses. Já o alho proveniente da China deve também chegar nos próximos meses. O envio do alho ao Brasil por esses dois países neste ano atrasou devido ao fechamento de casas de embalagem (packing houses) na Argentina e a problemas no carregamento do produto na China, logo no início da pandemia do novo coronavírus. Os problemas observados nesses dois principais países exportadores, em conjunto com a alta do dólar, levaram a um maior preço de comercialização do produto no mercado nacional, que certamente se manterá elevado, pelo menos no curto prazo, podendo influenciar no consumo interno.

Com relação à batata, o Brasil importa principalmente o produto na forma pré-frita congelada. Em 2019, o país importou 340,5 mil toneladas em um valor de US$ 321,1 milhões, o que equivale a cerca de 60% do volume consumido de batata pré-frita congelada anualmente no país. Desse volume importado, cerca de 57% teve origem na Argentina, embora Bélgica e Holanda também sejam importantes fornecedores de batata processada. Com o início da pandemia e o fechamento de restaurantes, principalmente redes fast food, nas quais o consumo de batata frita é maior, as importações da Argentina foram reduzidas. Produtores argentinos, por exemplo, foram incitados a colocar a sua batata fresca no mercado interno, uma vez que as indústrias paralisaram ou encerraram suas atividades, recusando o produto para processamento.

Segundo informações disponibilizadas pelo Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (CEPEA-Esalq/USP), a necessidade de isolamento social implementada em boa parte dos municípios brasileiros, em consequência da covid-19, tem impactado negativamente na demanda de cebola pelo brasileiro. O país produz boa parte da cebola consumida, embora possa haver importações ocasionais, a depender do equilíbrio entre demanda e oferta interna. Em 2019, o país importou 211,5 mil toneladas de cebola fresca (in natura), principalmente da Argentina (71% do total), mas também de países como Holanda, Espanha e Chile. Em situação normal de preços altos da cebola brasileira, a cebola argentina deveria estar entrando no país em maior volume. No entanto, a necessidade de isolamento social imposta no país vizinho, com reflexos nas atividades no campo, principalmente no que diz respeito à mobilidade de mão de obra, e nas unidades de beneficiamento, classificação e embalagem do produto, tem reduzido o comércio entre os dois países, mesmo com o preço atrativo.

Com a proximidade do fim da safra de cebola catarinense e até que as cebolas das regiões Sudeste e Centro-Oeste comecem a ser ofertadas, a cebola argentina deverá ser a responsável por suprir o mercado brasileiro. De todo modo, há expectativa que a exportação de cebola argentina para o Brasil siga restrita, em decorrência de medidas adotadas pelo país vizinho para evitar aglomerações de pessoas. A expectativa é que o volume de cebola argentina exportado para o Brasil em 2020 seja menor do que o de 2019. Apesar de uma menor demanda interna pelo produto em relação a anos anteriores, devido à covid-19, a expectativa é para aumentos no preço da cebola até que a safra 2020 do Sudeste, do Centro-Oeste e do Nordeste comece a abastecer o mercado interno.

Com relação às hortaliças leguminosas ou pulses (ervilha, lentilha e grão-de-bico), o Brasil tem sido um tradicional importador. Em 2019, importamos cerca de 30,5 mil toneladas de ervilha seca, 14,4 mil toneladas de lentilha e 7,2 mil toneladas de grão-de-bico, o que representou valores de US$ 14 milhões, US$ 7,6 milhões e US$ 6 milhões, respectivamente. A demanda nos mercados interno e externo desses produtos está superaquecida, embora se observe um aumento no preço dos produtos importados devido à alta do dólar. A ervilha seca, destinada à indústria de reidratação, ou a ervilha partida têm sido importadas principalmente da Argentina (68% do total) e do Canadá. Assim como para o alho e a cebola, as medidas impostas pelo governo argentino têm dificultado o transporte desses produtos.

Já a quase totalidade da lentilha importada pelo Brasil vem do Canadá, e os volumes estão sendo comercializados normalmente. A produção de lentilha na Argentina, em 2019, foi muito baixa. O grão-de-bico, importado principalmente do México (57% do total) e da Argentina teve, em 2019, uma redução de cerca de 20% na importação em relação ao ano anterior, e espera-se que esse volume de importação diminua em 2020 em razão do aumento da produção nacional. Vale mencionar que o grão-de-bico no mercado internacional encontra-se com preços não competitivos. Assim, o fornecimento desses grãos está normal, não havendo aparentemente prejuízos na importação em decorrência da pandemia.

Independente das consequências na produção e na comercialização de produtos olerícolas no Brasil, causadas pela pandemia do coronavírus, parece ser chegada a hora dos diversos atores das cadeias de valor de hortaliças unirem esforços (pesquisa, ensino, extensão, produtores, empresas de insumos, governo e outros) no sentido de viabilizar a produção competitiva e sustentável dessas culturas no país, principalmente para que o setor tenha competitividade frente aos países dos quais importamos. Esse aumento de competitividade, sem dúvida, depende de uma série de fatores, entre eles, fomento (incluindo crédito) à produção, implementação de políticas públicas e de outras diretrizes, e promoção de marcos regulatórios. Por outro lado, a dependência de importações e a vulnerabilidade do setor produtivo nacional decorre de diversos fatores, como protecionismo (ex. alho), menor competitividade (ex. batata), acordos bilateriais (ex. cebola), falta de interesse das empresas importadoras no fomento e/ou menor custo do produto importado (ex. pulses).

A crise causada pela pandemia do novo coronavírus veio alertar aos países dependentes de importações de alimentos o risco que essa dependência pode trazer à própria segurança alimentar nacional, fazendo-se necessário rever o abastecimento interno dessas importantes olerícolas. O país apresenta tecnologia, condições climáticas favoráveis à produção na maior parte do ano, dependendo da região, recursos naturais abundantes, disponibilidade de mão de obra, empreendorismo de seus produtores rurais e demais estruturas para fomentar a produção nacional sem a necessidade de recorrer anualmente às importações de tais produtos.

Por outro lado, tentando seguir o caminho das commodities – em que o país é um dos maiores exportadores – ou mesmo de algumas frutas, devemos buscar novos mercados (países emergentes e ou alternativos) e ampliar o nosso leque de exportação de hortaliças. Isso pode ser feito com a organização do setor por meio de cooperativas, ou por uma maior profissionalização dos produtores, e também pela melhoria na gestão dos empresários rurais, gerando, assim, uma maior competitividade do nosso produto em relação aos outros países competidores.

Além disso, há também que se estimular e/ou observar o atendimento às normas internacionais e aos pré-requisitos de boas práticas e de qualidade em relação à exportação; a implementação de uma maior mecanização e automação das diferentes atividades agrícolas; o aumento da conectividade nas propriedades rurais, visando à utilização de tecnologias digitais; a intensificação da cadeia de frio e da logística; entre outros aspectos. Sem dúvida, a abertura de novos mercados e produtos, não só permitirá o aumento da renda de produtores e empresas, mas também irá melhorar, significativamente, “por tabela”, a qualidade do produto ofertado internamente no país. Finalmente, o novo coronavírus, decretado como pandemia pela Organização Mundial de Saúde (OMS), está sendo uma grande oportunidade para o governo, empresas, produtores e para a sociedade geral repensarem a sua atuação e a sua forma de organização em busca de caminhos alternativos. Momentos de crise são propícios para identificar novas oportunidades, e ir além, inovar e buscar novas experiências.

FONTE: Revista Cultivar

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